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11 anos sem Paulo de Britto

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Paulo de Britto, na época gerente administrativo da Emissora Rural, fala na inauguração da Rádio Grande AM, 1981, a convite do Senador Nilo Coelho e esposa.

Neste 3 de julho, sábado,  faz 11 anos que papai, Paulo de Britto, se encantou. Uso sempre essa expressão tomada emprestada de Guimarães Rosa, que disse: “As pessoas não morrem, ficam encantadas”. Encantamento como estado que dota pessoas de uma aura que suscita admiração e respeito não apagadas pelo tempo nem pela vida material que seguem. Ele se encantou 9 meses depois de mamãe, quando ainda nem tínhamos assimilado a mudança dela para esse patamar.

Papai foi um autodidata; frequentou apenas oito meses de escola. Com sua vida de homem simples, exerceu funções de destaque no futebol da cidade, esporte que admirava. O futebol era disputado só base no “amor à camisa”, na vocação. Junto com seu Bandeira, dileto amigo, fez parte da Junta Disciplinar Desportiva. Depois foi presidente da Liga Desportiva e ainda presidente do América Futebol Clube. Como presidente desse time, dava muitos pitacos de treinador. Opinar não fazia parte de seu perfil; era incisivo e queria ser atendido. Um fato interessante dessa época ainda faz rir: num dos jogos, pelo lado de dentro do alambrado, ele ouviu um torcedor gritar uma ofensa. Imediatamente levantou-se e, por entre os arames da parte de cima do alambrado, soqueou a boca do ofensor. Depois contou: “o camarada (usava muito esse termo) abriu a boca e mordeu o canto de minha unha com o único dente que tinha, me ferindo. Que azar!” Esse era o Paulo desportista, respirando o que fazia.

Papai deixou três livros: um já publicado, suas memórias de menino; dois em processo de revisão e edição, memórias de Petrolina e outras. Tinha o dom da escrita e o exerceu muito bem: “Dedé para mim, Zé Quati para os outros, civilmente, José de Britto Nogueira, era meu avô paterno. […] Jacinta, rapariga dele, esposa “in extremis”, era rendeira talentosa, sentava-se na esteira, almofada entre as pernas e, ao ritual da dança dos bilros, operava a magia de transferir para a alvura da linha palmos e palmos de delicados poemas […]. Dedé e Jacinta se foram. Ficou a casinha se acabando, focaram os bilros calados, a renda empoeirada e a melancolia no lugar deles” (conto “Dedé”, livro “O bairro encantado”). Esse foi o Paulo escritor, exalando poesia em suas prosas.

Mais que isso tudo, na simplicidade do cotidiano, papai deixou exemplos que ainda nos são luminosos e dão sentido a muitas ações e pensamentos, a despeito de todas as transformações dos tempos. Esse é o Paulo pai, e são  eles a razão de seu encantamento.

A bênção, pai!

Vinicius, Irene, Ivan, Ivete, Sergio(in memorian), Wendell e Jéssica